Admito que nessas férias tenho
assistido muitos filmes, o que, aliás costumo fazer com frequência quando saio
de férias.
Ontem assisti ao filme On the
Road (acho que o título em português é Na Estrada), do diretor brasileiro
Walter Salles. O filme, para quem não sabe, é baseado no romance homônimo e claramente autobiográfico do escritor americano Jack Kerouac.
Alguém aí já leu? Comprei esse
livro há mais de 10 anos atrás e não consegui lê-lo inteiro. Acho que nem
cheguei à metade. Não consegui ter empatia por nenhum dos personagens. É
possível ter alguma leitura minimamente satisfatória sem sentir empatia pelos
protagonistas?
Assim, quando saiu o filme, fiz questão
de assistir. Sempre quis entender a importância e dimensão que dão ao livro e
achei que com o filme conseguiria.
Antes de fazer algumas
considerações a respeito, vou fazer um breve resumo do filme em si. Se você
ainda não assistiu nem leu o livro e tem interesse em fazê-lo, então é melhor
parar de ler, pois vou resumir o filme e contar seu final, que é fundamental
para que se possa entender a coisa.
O filme basicamente mostra um
período de uns 2 anos na vida de Dean e Sal no final dos anos 40 e começo dos
50. Dean é um bêbado imprestável completamente irresponsável e inconsequente.
Sal, que é escritor, também é, porém um pouco menos, mas por outros motivos.
Dean e Sal passam o filme todo bebendo, se drogando e viajando.
A história começa quando Sal e
Dean se conhecem, logo após a morte do pai de Sal. Isso é um componente muito
importante na história, embora tenha sido pouco aprofundado. Entendi que a
perda do pai foi um episódio importante na vida de Sal. Foi o que deu o start
para sua jornada de excessos em busca de algo que nem ele sabia bem o que era.
No final a gente entende que na verdade, o que ele busca, é sua própria
identidade. Parece idiota, piegas e clichê, mas não é. Nem um pouco. Nem de
longe.
Quando não estão juntos na
estrada, Sal e Dean, estão indo um a procura do outro. Nessa, eles acabam
cruzando o país pelo menos 2 vezes. Nessas viagens outros personagens
secundários aparecem, como outros amigos dos caras, Carlo, Ed, Bull e as
garotas Marylou, Camille e Terry, que acabam se envolvendo com Sal e Dean. O
fato mais relevante aqui é que Sal acaba gostando mais do que devia de Marylou
que é a namorada favorita de Dean.
Outro fator interessante e
fundamental para se entender corretamente o filme é a conversa entre Sal e
Bull, onde esse alerta Sal que Dean é um egoísta autodestrutivo que exige tudo
de quem o cerca e não oferece nada em troca.
Nessa jornada sem destino
(nenhuma referência aqui ao filme Easy Rider), Dean, Sal e qualquer um que os
acompanhe vão indo sem motivo nem objetivo algum, tanto é que quando finalmente
chegam onde queriam, tratam de voltar para seu local de origem. A parte boa, é
que a viagem se dá na maior parte do tempo a bordo de um Hudson 1948 muito
legal e sempre em alta velocidade. Dean só dirige no pau. Durante todo o
trajeto que fazem, Sal vai tomando notas de tudo que experimenta para escrever
seu livro.
Quando finalmente retornam a Nova
Iorque, seu ponto de partida, Sal, que ainda não conseguiu escrever uma linha
sequer, resolve ir até o México. Dean acaba indo com ele, dessa vez a bordo de
um Ford 46. No México eles acabam cometendo os maiores excessos com bebidas,
drogas e prostitutas mexicanas da pior estirpe. Aqui, Sal acaba ficando muito
doente. Dean, como havia alertado Bull, volta para os EUA para resolver seu
divórcio com Camille e larga Sal na roubada, doente e sem dinheiro, em algum
buraco mexicano esquecido por Deus.
Uns meses depois, Dean procura
Sal novamente, sendo que Dean se apresenta totalmente estropiado pelo abuso de
álcool e drogas. Nesse momento Sal está de saída para uma apresentação de Jazz
(a trilha sonora é demais, com Jazz da melhor qualidade o tempo todo). É claro
que depois de abandonado por Dean no México, Sal não é mais o mesmo. Ele
descarta Dean prontamente, se dando seu segundo start fundamental. A partir da
ruptura com Dean ele finalmente consegue escrever. Aqui termina o filme.
Agora, por que motivos esse livro
foi tão importante e desencadeou todo um movimento cultural nos anos 50 – o
movimento Beatnick?!
Os EUA não passava por nenhuma
turbulência nessa época. A não ser que a gente considere que a narrativa
remonta a 1947, apenas 2 anos após o fim da Segunda Guerra. Sempre que acaba um
período de alta tensão como é um período de guerra, abre-se espaço para os
excessos. Foi assim nos chamados “Loucos Anos 20”, também período pós-guerra e
talvez tenha sido o caso aqui.
Li uma vez, uma opinião do
saudoso Paulo Francis, em que ele sustentava que o fato de que, quando Kennedy
e Khrushchov chegaram a uma solução pacífica para a crise dos mísseis soviéticos
em Cuba, o resto do mundo pôde respirar aliviado. Todos teriam entendido que
o fim do mundo, através de uma guerra
nuclear não era inevitável, dando início aos excessos dos anos 60. Discordo
humildemente de Francis, entendendo que a coisa é um pouco mais antiga.
Não sei se alguém vai concordar
comigo, mas foi aqui, com esse livro e seus desdobramentos culturais e
comportamentais que foi aberta a caixa de Pandora da contracultura, contestação
e todas as correntes ideológicas e sociais que chegariam à maturidade nos anos
60.
O que vivemos hoje, para o bem e
para o mal, é consequência direta desses movimentos culturais, e, na minha
modesta opinião, esse terreno começou a ser arado com a publicação de On the
Road em 1957.
O que você acha?
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